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CHARGEBACK: Como Recuperar o Dinheiro Bloqueado? | Mercado Pago, PagSeguro, Getnet e Outros

No dinâmico mundo do comércio eletrônico, vendedores online enfrentam diversos desafios, e um dos mais frustrantes é o chargeback. Se você utiliza serviços de intermediadores de pagamento como Mercado Pago, PagSeguro ou similares, é provável que já tenha se deparado com esta situação: o bloqueio de valores recebidos por uma venda, deixando você sem acesso ao seu dinheiro e, muitas vezes, sem o produto vendido.

Este artigo tem como objetivo esclarecer o que é o chargeback, por que ele ocorre e, mais importante, como você pode recuperar seu dinheiro bloqueado. Além disso, exploraremos a possibilidade de buscar indenização por danos morais em casos específicos.

Nossa abordagem será fundamentada em bases legais sólidas, sem invenções ou especulações, para fornecer a você, vendedor, as ferramentas necessárias para proteger seus direitos e seu negócio.

O que é Chargeback?

O chargeback é um mecanismo de proteção ao consumidor que permite a contestação e reversão de uma transação feita com cartão de crédito. Quando um chargeback é iniciado, o valor da transação é temporariamente bloqueado ou revertido, ficando indisponível para o vendedor até que a situação seja resolvida.

É importante notar que o chargeback não possui uma definição específica na legislação brasileira. No entanto, é uma prática reconhecida e regulamentada no mercado de meios de pagamento. Sua base legal pode ser encontrada no direito do consumidor de contestar cobranças indevidas, conforme estabelecido no artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990):

“Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.”

Este artigo, embora não mencione explicitamente o chargeback, estabelece o princípio de que o consumidor tem o direito de questionar cobranças, o que serve como fundamento para o processo de chargeback.

Quem são os envolvidos no processo de Chargeback?

O processo de chargeback envolve múltiplas partes, cada uma com um papel específico:

  1. Vendedor: É você, que oferece produtos ou serviços online. No contexto legal, dependendo da situação, você pode ser considerado tanto fornecedor quanto consumidor (veremos mais sobre isso na seção sobre a Teoria Finalista Mitigada).
  2. Consumidor: É quem realiza a compra do produto ou serviço. No âmbito do Código de Defesa do Consumidor, é definido como “toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final” (art. 2º, CDC).
  3. Intermediador de pagamento: São empresas como Mercado Pago, PagSeguro, entre outras, que processam as transações. Legalmente, são consideradas fornecedoras de serviços, conforme definido no art. 3º do CDC: “Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.”
  4. Banco emissor do cartão: É a instituição financeira que emitiu o cartão de crédito usado na transação.
  5. Bandeira do cartão: Empresas como Visa, Mastercard, que estabelecem as regras e procedimentos para o processo de chargeback.

Entender o papel de cada um desses atores é crucial para navegar o complexo processo de chargeback e buscar a recuperação dos valores bloqueados.

Por que o Chargeback ocorre?

O chargeback pode ocorrer por diversas razões, e é essencial entender cada uma delas para melhor se proteger e argumentar em caso de contestação. Aqui estão as principais causas:

  1. Fraude: Uso não autorizado do cartão de crédito. Este é um dos motivos mais comuns e preocupantes. Segundo o art. 14, § 3º do CDC, o fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar “a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro”.
  2. Produto não recebido: O consumidor alega não ter recebido o item comprado. Neste caso, o art. 35 do CDC oferece proteção ao consumidor, permitindo-lhe exigir o cumprimento forçado da obrigação.
  3. Produto diferente do anunciado: O item recebido não corresponde à descrição. Isto está relacionado ao princípio da vinculação da oferta, previsto no art. 30 do CDC: “Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.”
  4. Cobrança duplicada: O consumidor foi cobrado mais de uma vez pela mesma transação. Isso viola o princípio da boa-fé objetiva, previsto no art. 422 do Código Civil.
  5. Cancelamento de serviço recorrente: O consumidor cancelou um serviço, mas continuou sendo cobrado. O CDC, em seu art. 51, IV, considera nulas as cláusulas que “estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade”.
  6. Erro de processamento: Falhas técnicas no sistema de pagamento podem levar a cobranças indevidas.

Cada uma dessas situações requer uma abordagem específica na contestação do chargeback, e o vendedor deve estar preparado para lidar com todas elas.

Quais São As Principais Intermediadoras de Pagamento Que Realizam Chargeback?

As principais intermediadoras de pagamento que realizar chargeback são exatamente as principais intermediadoras de pagamento. Isso porque é impossível para uma grande intermediadora operar sem que ocorram problemas na execução do serviço – seja por culpa da própria intermediadora ou de terceiros.

Assim, é possível que haja questões relativas a chargeback com:

  • Chargeback Mercado Pago
  • Chargeback Pagseguro
  • Chargeback Getnet
  • Chargeback PicPay
  • Chargeback Pagar.me
  • Chargeback Vindi
  • Chargeback Cielo
  • Chargeback AJ
  • Chargeback Itaú
  • Chargeback de outras intermediadoras de pagamento

O prejuízo do Chargeback

O chargeback pode causar diversos prejuízos aos vendedores, muito além da simples perda do valor da venda. Vamos analisar detalhadamente cada um desses prejuízos:

  1. Perda do valor da venda: Este é o prejuízo mais óbvio e imediato. O vendedor não apenas perde o pagamento pela mercadoria ou serviço, mas muitas vezes também perde o próprio produto, que já foi enviado ao consumidor.
  2. Custos adicionais de taxas administrativas: Muitas plataformas de pagamento cobram taxas administrativas para processar chargebacks. Essas taxas podem variar de R$ 15 a R$ 50 ou mais por transação contestada.
  3. Possível bloqueio da conta na plataforma de pagamento: Intermediadores de pagamento costumam monitorar a taxa de chargebacks de cada vendedor. Se essa taxa ultrapassar um certo limite (geralmente entre 1% e 2% das transações), a conta do vendedor pode ser temporária ou permanentemente bloqueada.
  4. Danos à reputação do vendedor: Chargebacks frequentes podem afetar negativamente a reputação do vendedor em plataformas de marketplace, levando a uma diminuição nas vendas futuras.
  5. Tempo e recursos gastos na contestação: O processo de contestação de um chargeback demanda tempo e, muitas vezes, recursos financeiros, desviando o foco do vendedor de suas atividades principais.
  6. Aumento nos custos operacionais: Para se proteger contra chargebacks, muitos vendedores precisam investir em sistemas de segurança mais robustos e em processos de verificação mais rigorosos, aumentando seus custos operacionais.
  7. Impacto no fluxo de caixa: O bloqueio de valores pode causar sérios problemas de fluxo de caixa, especialmente para pequenos vendedores que dependem de cada venda para manter suas operações.

É importante ressaltar que, do ponto de vista legal, muitos desses prejuízos podem ser considerados danos emergentes e lucros cessantes, conforme definido no art. 402 do Código Civil: “Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar.”

O que é e como funciona o Chargeback

O processo administrativo de chargeback geralmente segue estas etapas:

  1. Contestação pelo consumidor: O consumidor contesta a transação junto ao banco emissor do cartão. Esta contestação deve ser feita dentro de um prazo específico, que varia de acordo com a bandeira do cartão e o motivo da contestação.
  2. Notificação ao banco emissor: O banco emissor inicia o processo de chargeback com a bandeira do cartão. Neste ponto, o banco geralmente realiza uma investigação preliminar para verificar a validade da contestação.
  3. Comunicação com a bandeira do cartão: A bandeira do cartão notifica o intermediador de pagamento sobre a contestação. É importante notar que todo este processo é regulado por normas específicas de cada bandeira de cartão.
  4. Ação do intermediador de pagamento: O intermediador de pagamento bloqueia o valor da transação e notifica o vendedor. Este bloqueio é uma medida preventiva enquanto a disputa está em andamento.
  5. Prazo para o vendedor: O vendedor tem um prazo para apresentar evidências que comprovem a legitimidade da transação. Este prazo geralmente varia entre 5 e 15 dias, dependendo do intermediador de pagamento.
  6. Análise das evidências: Com base nas evidências apresentadas pelo vendedor, a disputa é analisada. Esta análise leva em consideração as políticas da bandeira do cartão e as leis de proteção ao consumidor.
  7. Resolução: A disputa é resolvida a favor do consumidor ou do vendedor. Se for a favor do consumidor, o valor é devolvido a ele. Se for a favor do vendedor, o valor é desbloqueado e liberado para o vendedor.

É crucial entender que, embora este processo seja padronizado pelas bandeiras de cartão, ele deve respeitar as leis brasileiras, incluindo o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil.

Bases legais para contestar um Chargeback

Teoria Finalista Mitigada

A Teoria Finalista Mitigada é uma interpretação jurisprudencial que amplia o conceito de consumidor para incluir pequenos empreendedores ou profissionais que, embora não sejam os destinatários finais do produto ou serviço, encontram-se em situação de vulnerabilidade frente a grandes fornecedores.

Esta teoria tem sido aplicada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em diversos casos. Por exemplo, no REsp 1.195.642/RJ, a Ministra Nancy Andrighi afirmou:

“A jurisprudência do STJ, tomando por base o conceito de consumidor por equiparação previsto no art. 29 do CDC, tem evoluído para uma aplicação temperada da teoria finalista frente às pessoas jurídicas, num processo que a doutrina vem denominando finalismo aprofundado, consistente em se admitir que, em determinadas hipóteses, a pessoa jurídica adquirente de um produto ou serviço pode ser equiparada à condição de consumidora, por apresentar frente ao fornecedor alguma vulnerabilidade, que constitui o princípio-motor da política nacional das relações de consumo.”

Esta interpretação permite que vendedores online, especialmente os de pequeno porte, possam utilizar o Código de Defesa do Consumidor (CDC) para se defender contra práticas abusivas de intermediadores de pagamento.

Código de Defesa do Consumidor

O CDC pode ser aplicado na relação entre vendedor e intermediador de pagamento quando há evidente desequilíbrio entre as partes. Neste contexto, algumas cláusulas contratuais podem ser consideradas abusivas, como:

  • Cláusulas que transferem integralmente o risco da operação para o vendedor
  • Cláusulas que permitem o bloqueio unilateral de valores sem prévia notificação

O artigo 51, IV do CDC estabelece:

“São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: […] IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade;”

Além disso, o artigo 6º, VIII do CDC prevê a inversão do ônus da prova a favor do consumidor quando for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente. Este princípio pode ser invocado pelo vendedor em situação de vulnerabilidade frente ao intermediador de pagamento.

Código Civil e Contratos de Adesão

Caso o juiz entenda que não se aplica o CDC, ainda é possível argumentar com base no Código Civil, especificamente no que tange aos contratos de adesão.

O artigo 423 do Código Civil estabelece:

“Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente.”

Este artigo é particularmente relevante no contexto de contratos com intermediadores de pagamento, que são tipicamente contratos de adesão. Quando houver dúvidas sobre a interpretação de cláusulas relacionadas ao chargeback, o vendedor (como aderente) pode argumentar que a interpretação deve ser feita a seu favor.

Além disso, o princípio da boa-fé objetiva, previsto no art. 422 do Código Civil, exige que as partes ajam com lealdade e cooperação mútua na execução do contrato:

“Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.”

Este princípio pode ser invocado para argumentar que o intermediador de pagamento deve agir de forma transparente e cooperativa no processo de chargeback, não simplesmente bloqueando os valores do vendedor sem uma investigação adequada.

Como recuperar o valor bloqueado por Chargeback

Para recuperar o valor bloqueado por chargeback, é essencial seguir um processo metódico e bem documentado. Aqui estão os passos detalhados:

Reúna evidências:

  • Comprovantes de envio do produto (nota fiscal, rastreamento)
  • Confirmação de entrega assinada pelo cliente
  • Todas as comunicações com o cliente (e-mails, mensagens)
  • Descrição detalhada do produto ou serviço vendido
  • Políticas de venda e devolução claramente comunicadas ao cliente

Conteste o chargeback:

  • Responda à notificação do intermediador de pagamento dentro do prazo estipulado (a resposta fora do prazo ou ausência de resposta não impede a defesa do direito na justiça, mas dificulta)
  • Apresente todas as evidências reunidas de forma organizada
  • Explique detalhadamente por que a transação é legítima

Busque negociação:

  • Tente resolver a situação diretamente com o intermediador de pagamento
  • Solicite uma revisão do caso se a decisão inicial for desfavorável
  • Peça esclarecimentos sobre os motivos da decisão

Procure orientação jurídica:

  • Consulte um advogado especializado em direito digital ou do consumidor
  • Discuta a possibilidade de aplicação da Teoria Finalista Mitigada
  • Analise se há cláusulas abusivas no contrato com o intermediador

Ingresse com ação judicial:

  • Como último recurso, considere entrar com uma ação judicial

Ao ingressar com uma ação judicial, seu advogado deve trabalhar com duas teses principais:

  1. Aplicação do CDC com base na Teoria Finalista Mitigada
  2. Interpretação do contrato de adesão conforme o Código Civil

É importante ressaltar que cada caso tem suas particularidades e deve ser analisado individualmente.

Possibilidade de indenização por danos morais

Em alguns casos, além da recuperação do valor bloqueado, é possível pleitear indenização por danos morais. Os tribunais têm entendido que o bloqueio indevido de valores pode gerar dano moral, especialmente quando:

  1. O bloqueio afeta a subsistência do vendedor (verba de natureza alimentar)
  2. Há negativação indevida do nome da empresa nos órgãos de proteção ao crédito
  3. O bloqueio causa prejuízos significativos à atividade empresarial

O valor da indenização por danos morais geralmente varia entre 5 e 20 salários mínimos, dependendo das circunstâncias do caso. No entanto, é importante notar que não há um valor fixo estabelecido em lei, e os tribunais têm discricionariedade para determinar o montante com base nos fatos específicos de cada caso.

Fatores que influenciam o valor da indenização por danos morais

FatorImpacto no valor da indenização
Tempo de bloqueioQuanto maior o tempo, maior a tendência de indenização mais alta
Impacto financeiroPrejuízos significativos podem levar a indenizações maiores
Porte do vendedorPequenos vendedores tendem a receber indenizações proporcionalmente maiores
Conduta do intermediadorFalta de transparência ou cooperação pode aumentar a indenização
ReincidênciaCasos repetidos contra o mesmo intermediador podem elevar o valor

É crucial lembrar que a indenização por danos morais não é automática e deve ser devidamente fundamentada e comprovada.

Prevenção de Chargebacks

Embora o foco deste artigo seja a recuperação de valores bloqueados, a prevenção de chargebacks é igualmente importante. Aqui estão algumas estratégias para reduzir o risco:

  1. Descrições claras e precisas: Forneça descrições detalhadas e precisas dos produtos ou serviços, incluindo fotos de alta qualidade quando aplicável.
  2. Política de devolução transparente: Tenha uma política de devolução clara e facilmente acessível em seu site ou plataforma de vendas.
  3. Atendimento ao cliente eficiente: Responda prontamente às perguntas e reclamações dos clientes. Muitos chargebacks podem ser evitados com boa comunicação.
  4. Confirmação de pedido: Envie uma confirmação detalhada do pedido, incluindo descrição do produto, preço, data estimada de entrega e informações de contato.
  5. Rastreamento de envio: Use serviços de entrega com rastreamento e exija assinatura na entrega para produtos de alto valor.
  6. Processamento rápido: Processe e envie os pedidos o mais rápido possível para evitar chargebacks por “mercadoria não recebida”.
  7. Nome da empresa reconhecível: Certifique-se de que o nome que aparece na fatura do cartão de crédito seja facilmente reconhecível pelo cliente.
  8. Autenticação adicional: Para transações de alto valor, considere usar métodos de autenticação adicionais, como verificação em duas etapas.
  9. Monitoramento de fraudes: Implemente sistemas de detecção de fraudes para identificar transações suspeitas antes que se tornem chargebacks.
  10. Educação do cliente: Forneça informações claras sobre o processo de compra, entrega e como entrar em contato em caso de problemas.

Implementar essas estratégias pode ajudar significativamente a reduzir a incidência de chargebacks, protegendo seu negócio e evitando bloqueios de valores.

Estudo de caso Sobre Chargeback

Para ter em vista uma dimensão prática de como o chargeback afeta o comércio empresarial e de como ele pode ser resolvido segundo os tribunais, vamos estudar alguns dados e realidades do problema.

Chargeback no e-commerce brasileiro

Para ilustrar a relevância e o impacto dos chargebacks no cenário brasileiro, vamos analisar alguns dados do setor de e-commerce:

  • Segundo a Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm), o índice médio de chargebacks no e-commerce brasileiro em 2020 foi de 1,5% do faturamento.
  • Um estudo da ClearSale em 2021 apontou que 55% dos chargebacks no Brasil são por fraude, 25% por problemas logísticos e 20% por insatisfação do cliente.
  • A Febraban (Federação Brasileira de Bancos) estima que as fraudes no e-commerce brasileiro causaram prejuízos de R$ 1,8 bilhão em 2020.

Estes dados demonstram a importância de estar preparado para lidar com chargebacks, tanto do ponto de vista preventivo quanto na recuperação de valores bloqueados.

Chargeback Nos Tribunais

Os casos de chargeback, por tratar-se de direito privado e sem partes diferenciadas envolvidas, são enfrentados pela justiça comum dos tribunais estaduais.

O Superior Tribunal de Justiça, o STJ, ainda não tem uma jurisprudência relevante. Os tribunais estaduais, no entanto, são todos favoráveis à tese jurídica de que a intermediadora é quem deve arcar com o prejuízo do chargeback – alguns tribunais, no entanto, são mais rigorosos do que outros quanto aos requisitos da responsabilização.

O TJSP (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo), por exemplo, é um dos tribunais brasileiros com jurisprudência mais consolidada a favor do vendedor. A exemplo:

Apelação – Parte ré, intermediadora de transações on-line por cartão de crédito, que deixou de repassar ao lojista o valor das vendas, sob alegação de contestação pelo portador do cartão (“chargeback”) – Sentença de procedência, determinando o repasse à autora – Apelação da ré – Alegação de ilegitimidade passiva afastada – O contrato de intermediação com o dever do repasse dos valores foi feito em face da ré, que é parte legítima para responder pela demanda – Cláusulas contratuais que permitem o chargeback que são abusivas, pois transferem ao lojista toda a responsabilidade pela venda fraudulenta, quando quem realiza o controle e autoriza as transações é unicamente a ré – Uma vez autorizada a transação e entregues as mercadorias pelo lojista de boa-fé ao suposto comprador autorizado pela empresa intermediadora, surge o dever desta realizar o repasse dos valores contratados, já que a autorização da venda se deu sem a constatação da fraude no momento oportuno – Precedentes deste Tribunal – Recurso improvido.

(TJ-SP – Apelação Cível: 10001917320238260082 Boituva, Relator: Tania Ahualli, Data de Julgamento: 25/06/2024, 12ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/06/2024)

A boa notícia é que 99% das intermediadoras de pagamento tem algum domicílio (matriz ou filial) em São Paulo, o que possibilita que a ação seja proposta no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (já que é um tipo de ação que não tem audiências).

Considerações finais

O chargeback é uma realidade no comércio eletrônico, mas não precisa ser um pesadelo para os vendedores. Conhecer seus direitos, as bases legais para contestar bloqueios indevidos e implementar estratégias de prevenção são fundamentais para proteger seu negócio.

Lembre-se:

  1. Documente todas as suas transações meticulosamente
  2. Responda prontamente às notificações de chargeback
  3. Busque orientação jurídica especializada quando necessário
  4. Não hesite em buscar seus direitos judicialmente se necessário
  5. Implemente estratégias de prevenção de chargebacks

Com as estratégias corretas e o suporte legal adequado, é possível recuperar valores bloqueados e, em alguns casos, até mesmo obter indenização por danos morais. Proteja seu negócio e garanta que as plataformas de pagamento ajam de forma justa e transparente.

Perguntas Frequentes Sobre Chargeback (FAQ)

Quanto tempo tenho para contestar um chargeback?
O prazo para contestar diretamente com a intermediadora pode variar dependendo do intermediador de pagamento, mas geralmente é entre 5 e 15 dias após a notificação. Contudo, o prazo para contestar judicialmente é de três anos (dependendo de cada caso).

Posso ser responsabilizado por fraudes cometidas por terceiros?
Não. O art. 14, § 3º do CDC estabelece que o fornecedor não será responsabilizado quando provar a culpa exclusiva de terceiros, mas faz parte do risco do negócio o que chamamos de fortuito interno, que são fraudes cometidas que referem-se àquele tipo de negócio. Assim, via de regra, a intermediadora será responsável pelo chargeback.

O que fazer se o intermediador de pagamento se recusar a liberar meus fundos mesmo após eu fornecer todas as evidências?
O primeiro passo é certificar-se de ter esgotado os pedidos extrajudiciais para liberação do dinheiro. Caso a negativa persista, deverá ser considerada uma ação judicial cominatória (obrigação de fazer) ou indenizatória.

Existe um limite de chargebacks que posso receber antes que minha conta seja bloqueada?
Isso varia por plataforma, mas muitas consideram uma taxa de chargeback acima de 1% como problemática. Contudo, se o vendedor puder provar que todas as vendas foram feitas respeitando as regras da plataforma, o bloqueio pode ser revertido.

Posso cobrar uma taxa do cliente para cobrir potenciais custos de chargeback?
Isso pode ser considerado abusivo sob o CDC. É melhor focar em estratégias de prevenção.

Chargeback é Crime?

Caso o consumidor conteste compras sabendo que não existe motivo para chargeback, isso poderá, eventualmente, caracterizar tipos penais como estelionato.

Quem fica com o prejuízo do chargeback?

De acordo com a jurisprudência atual, o prejuízo do chargeback fica com a intermediadora, já que ela não pode transferir o risco de seu negócio para os vendedores.

De quem é a responsabilidade pelo chargeback?

Segundo o código de defesa do consumidor, a responsabilidade poderá ser solidária entre a bandeira do cartão de crédito e a intermediadora de pagamentos. Contudo, a praxe jurídica é que seja a intermediadora quem responde judicialmente.

O que fazer em caso de chargeback?

Após realizar as contestações administrativas, deve-se juntar toda a documentação referente ao caso (comprovantes de venda, envio, entrega, nota fiscal etc) para dar entrada em uma ação indenizatória ou cominatória na justiça.

Tem Como Revereter um Chargeback?

Sim. Na maioria dos casos o chargeback é revertido na justiça porque existe jurisprudência pacífica no sentido de que é da intermediadora de pagamentos a obrigação de averiguar a lisura da compra.

Quem arca com o chargeback? Quem paga uma compra contestada?

É comum que as intermediadoras repassem o prejuízo do chargeback para os vendedores, o que é uma prática abusiva segundo os tribunais no Brasil, pois é o intermediador quem deve arcar com o chargeback e pagar a compra contestada para o vendedor.

Quem julga o chargeback?

Quando o problema não é resolvido pela própria intermediadora, o chargeback é julgado através da justiça comum de cada estado (TJSP, TJRJ, TJRS etc).

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Marcel Sanches
Marcel Sanches

Advogado na Ls Advogados. Especialista em Direito Privado e Atuação nos Tribunais Superiores. Utilizou IA para colocar esta camisa social, pois não queria tirar uma nova foto.

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