O Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) é uma condição neurobiológica que afeta milhões de brasileiros e pode, em casos mais graves, impactar significativamente a capacidade laboral. Quando os sintomas comprometem o desempenho profissional, muitas pessoas buscam benefícios previdenciários junto ao INSS. Entretanto, o processo de avaliação pericial para casos de TDAH possui particularidades importantes que precisam ser compreendidas pelos segurados. Neste artigo, abordaremos detalhadamente como funciona a perícia médica do INSS para avaliar casos de TDAH, quais documentos são necessários e como aumentar as chances de ter o benefício concedido.
Sumário
ToggleEntendendo o TDAH e sua relevância para a perícia médica
O TDAH é um transtorno neurobiológico caracterizado por sintomas de desatenção, hiperatividade e impulsividade que podem persistir ao longo da vida adulta. De acordo com a Classificação Internacional de Doenças (CID-10), o TDAH é classificado sob o código F90.0 – Distúrbios da atividade e da atenção.
Embora seja uma condição relativamente comum, o TDAH não é automaticamente considerado incapacitante para fins previdenciários. A concessão de benefícios como auxílio-doença (atualmente denominado Benefício por Incapacidade Temporária) ou aposentadoria por invalidez (Aposentadoria por Incapacidade Permanente) depende da comprovação de que os sintomas do transtorno comprometem significativamente a capacidade laboral do indivíduo.
A avaliação da incapacidade laboral em pessoas com TDAH é realizada por médicos peritos do INSS, que analisam não apenas o diagnóstico em si, mas também como os sintomas impactam a capacidade de trabalho do segurado em sua atividade habitual ou em qualquer outra que lhe garanta subsistência.
Base legal para avaliação do TDAH pelo INSS
A avaliação pericial do TDAH pelo INSS está fundamentada em diversas normas jurídicas. A Lei nº 8.213/91, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social, estabelece em seu artigo 42 que a aposentadoria por invalidez será devida ao segurado que “for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência”.
Já o artigo 59 da mesma lei prevê que o auxílio-doença será devido ao segurado que “ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos”.
O Decreto nº 3.048/99, que aprova o Regulamento da Previdência Social, também traz disposições importantes sobre a avaliação da incapacidade laboral. Em seu artigo 71, estabelece que “o auxílio-doença será devido ao segurado que, após cumprida, quando for o caso, a carência exigida, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de quinze dias consecutivos”.
Além disso, a Lei nº 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) também pode ser aplicável em casos de TDAH mais graves, que configurem deficiência, definida em seu artigo 2º como “impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”.
O processo de perícia médica do INSS para casos de TDAH
A perícia médica do INSS é um procedimento técnico realizado por médicos peritos com o objetivo de avaliar a capacidade laboral do segurado. No caso específico do TDAH, o processo possui algumas particularidades que merecem atenção.
Quando um segurado solicita um benefício por incapacidade em razão do TDAH, ele será submetido a uma avaliação pericial que seguirá um protocolo específico. Durante a consulta, o médico perito analisará os documentos médicos fornecidos, como laudos e exames, e realizará uma avaliação física e mental do paciente.
O perito avaliará a gravidade do TDAH e como ele afeta a capacidade do paciente de realizar suas atividades diárias e profissionais. Com base nessa avaliação, emitirá um parecer sobre a incapacidade do paciente e sua elegibilidade para o benefício solicitado.
Documentação necessária para a perícia de TDAH
A documentação médica é fundamental para a comprovação do diagnóstico e da incapacidade laboral decorrente do TDAH. Os principais documentos que devem ser apresentados na perícia são:
- Laudos médicos detalhados, preferencialmente emitidos por psiquiatras ou neurologistas, contendo o diagnóstico de TDAH com o respectivo CID (F90.0);
- Histórico de tratamento médico, incluindo medicações utilizadas e suas dosagens;
- Exames complementares, quando existentes, como testes neuropsicológicos;
- Relatórios de outros profissionais envolvidos no tratamento, como psicólogos e terapeutas ocupacionais;
- Atestados de afastamento do trabalho relacionados ao TDAH;
- Receitas médicas das medicações utilizadas para o tratamento.
É importante que os laudos médicos sejam detalhados e contenham informações sobre os sintomas apresentados pelo paciente, o impacto desses sintomas em sua vida diária e profissional, os tratamentos já realizados e seus resultados, bem como o prognóstico da condição.
Para ser aprovado pela perícia, o laudo deve conter informações detalhadas sobre os sintomas do paciente, histórico médico, resultados de testes psicológicos e relatos de comportamento em diferentes contextos. Além disso, é importante incluir observações sobre como o TDAH afeta a capacidade funcional do indivíduo em suas atividades diárias, escolares e profissionais.
Critérios avaliados pelo perito médico do INSS
Durante a perícia médica, o perito avaliará diversos aspectos relacionados ao TDAH e seu impacto na capacidade laboral do segurado. Os principais critérios considerados são:
- Gravidade dos sintomas de desatenção, hiperatividade e impulsividade;
- Impacto dos sintomas na capacidade de realizar as atividades laborais específicas da profissão do segurado;
- Presença de comorbidades associadas ao TDAH, como ansiedade, depressão ou transtorno bipolar;
- Resposta aos tratamentos já realizados;
- Prognóstico da condição;
- Possibilidade de reabilitação profissional.
É importante destacar que o perito não avaliará apenas a existência do diagnóstico de TDAH, mas principalmente como os sintomas impactam a capacidade laboral do segurado. Portanto, é fundamental que a documentação médica apresentada evidencie claramente esse impacto.
Preparação para a perícia médica do INSS em casos de TDAH
A preparação adequada para a perícia médica é fundamental para aumentar as chances de concessão do benefício. Seguem algumas orientações importantes:
- Reúna toda a documentação médica necessária, organizando-a em ordem cronológica;
- Certifique-se de que os laudos médicos são detalhados e evidenciam o impacto do TDAH em sua capacidade laboral;
- Leve para a perícia todas as medicações que utiliza para o tratamento do TDAH;
- Prepare-se para responder a perguntas sobre seus sintomas, tratamentos realizados e dificuldades enfrentadas no trabalho;
- Seja honesto e objetivo ao relatar seus sintomas e limitações;
- Evite exageros ou minimizações dos sintomas, pois isso pode comprometer a credibilidade de seu relato.
É importante lembrar que o processo geralmente envolve uma avaliação clínica detalhada, onde o médico analisa os sintomas, histórico médico e realiza testes específicos para diagnosticar o transtorno. Portanto, é fundamental relatar todos os sintomas e dificuldades enfrentadas no dia a dia para que o médico perito possa fazer uma avaliação precisa.
O que esperar durante a consulta pericial
A consulta pericial para avaliação do TDAH geralmente segue um roteiro específico. O médico perito iniciará com uma entrevista, na qual fará perguntas sobre os sintomas, histórico médico, tratamentos realizados e impacto do transtorno na vida profissional do segurado.
Em seguida, poderá realizar um exame clínico básico e analisar a documentação médica apresentada. É comum que o perito faça perguntas específicas sobre como os sintomas do TDAH afetam o desempenho das atividades laborais específicas da profissão do segurado.
Durante a consulta, o perito observará o comportamento do segurado, buscando identificar sinais compatíveis com o diagnóstico de TDAH, como inquietação, dificuldade de manter o foco na conversa, impulsividade nas respostas, entre outros.
É importante manter a calma durante a perícia e responder às perguntas de forma clara e objetiva. Evite divagações ou relatos muito longos, concentrando-se em descrever como os sintomas do TDAH impactam sua capacidade de trabalho.
Possíveis resultados da perícia médica para TDAH
Após a avaliação pericial, o médico perito emitirá um parecer que poderá resultar em diferentes desfechos:
- Concessão do benefício: quando o perito reconhece a incapacidade laboral decorrente do TDAH;
- Negativa do benefício: quando o perito não reconhece a incapacidade laboral ou considera que os sintomas não são graves o suficiente para justificar o afastamento do trabalho;
- Encaminhamento para reabilitação profissional: quando o perito considera que o segurado não pode mais exercer sua atividade habitual, mas pode ser reabilitado para outra função.
Em caso de concessão do benefício, o perito também definirá o prazo de duração, após o qual o segurado deverá passar por nova perícia (perícia de prorrogação) para avaliar a continuidade da incapacidade.
O que fazer em caso de negativa do benefício
Se o benefício for negado, existem duas opções principais. Primeiro, você pode entrar com um recurso administrativo no prazo estabelecido pelo INSS, fornecendo mais evidências médicas ou contestando as razões da negação. Segundo, é possível entrar com uma ação judicial para contestar a decisão.
O recurso administrativo deve ser apresentado no prazo de 30 dias contados da data em que o segurado tomar ciência da decisão. O recurso é analisado pelas Juntas de Recursos do Conselho de Recursos da Previdência Social (CRPS).
Para aumentar as chances de sucesso no recurso, é recomendável:
- Obter novos laudos médicos mais detalhados;
- Realizar exames complementares que possam evidenciar a gravidade do TDAH;
- Solicitar relatórios de outros profissionais envolvidos no tratamento;
- Apresentar documentos que comprovem o impacto do TDAH no desempenho profissional, como advertências no trabalho, avaliações de desempenho negativas, entre outros.
Caso o recurso administrativo seja negado, ainda é possível recorrer às Câmaras de Julgamento do CRPS e, posteriormente, ingressar com ação judicial.
Desafios específicos na avaliação pericial do TDAH
A avaliação pericial do TDAH apresenta alguns desafios específicos que merecem atenção. Um dos principais desafios é a natureza subjetiva de muitos dos sintomas do transtorno, que nem sempre são facilmente observáveis durante uma consulta pericial de curta duração.
Além disso, há uma variabilidade significativa na manifestação dos sintomas do TDAH, que podem ser mais ou menos evidentes dependendo do contexto e das demandas cognitivas da situação. Por exemplo, um adulto com TDAH pode conseguir manter o foco em atividades que lhe interessam, mas ter grande dificuldade em tarefas monótonas ou que exigem atenção sustentada.
Outro desafio é a frequente presença de comorbidades associadas ao TDAH, como ansiedade, depressão, transtorno bipolar, entre outras, que podem complicar o diagnóstico e a avaliação da incapacidade laboral.
Estratégias para superar os desafios na perícia de TDAH
Para superar os desafios na avaliação pericial do TDAH, algumas estratégias podem ser úteis:
- Apresentar laudos médicos detalhados que descrevam não apenas os sintomas, mas também como eles se manifestam em diferentes contextos e como impactam especificamente as atividades laborais;
- Incluir na documentação médica relatos de terceiros (colegas de trabalho, supervisores, familiares) que possam atestar as dificuldades enfrentadas no ambiente de trabalho;
- Realizar avaliações neuropsicológicas que possam objetivar os déficits cognitivos associados ao TDAH;
- Documentar a resposta aos tratamentos já realizados, evidenciando a persistência dos sintomas mesmo com intervenções adequadas;
- Considerar a possibilidade de ser acompanhado por um advogado especializado em direito previdenciário durante o processo.
É importante lembrar que a orientação de um advogado especializado pode ser crucial para aumentar as chances de sucesso na obtenção do benefício, especialmente em casos complexos como os de TDAH.
Conclusão
A perícia médica do INSS para avaliação do TDAH é um processo complexo que requer preparação adequada e documentação médica detalhada. Embora o TDAH não seja automaticamente considerado incapacitante, em casos graves, com sintomas que comprometem significativamente a capacidade laboral, é possível obter benefícios previdenciários como o auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez.
Se você está enfrentando dificuldades com a perícia médica do INSS para TDAH ou teve seu benefício negado e precisa de orientação especializada sobre como proceder, não hesite em buscar ajuda profissional para garantir que seus direitos sejam respeitados e que você tenha acesso aos benefícios a que tem direito. Um advogado especializado em direito previdenciário poderá avaliar seu caso específico e orientá-lo sobre as melhores estratégias para obter o reconhecimento da incapacidade laboral decorrente do TDAH.