Direito Trabalhista e Previdenciário
WhatsApp

Desvio de Função: Limpeza de Banheiros Deve Gerar Insalubridade

O desvio de função e o direito ao adicional de insalubridade são temas recorrentes na Justiça do Trabalho brasileira, especialmente quando se trata da limpeza de banheiros em ambientes corporativos. Este artigo busca esclarecer as nuances legais e práticas envolvidas nessa questão, analisando os direitos dos trabalhadores e as obrigações dos empregadores à luz da legislação trabalhista vigente e da jurisprudência dos tribunais superiores.

Entendendo o Desvio de Função

O desvio de função ocorre quando um empregado é contratado para exercer determinadas atividades, mas acaba realizando tarefas diferentes daquelas previstas em seu contrato de trabalho. Essa situação é comum em muitas empresas, especialmente as de pequeno porte, onde os funcionários frequentemente assumem responsabilidades além de suas atribuições originais.

Características do Desvio de Função

  • Realização de tarefas não previstas no contrato de trabalho
  • Ausência de alteração contratual formal
  • Manutenção da remuneração original
  • Potencial prejuízo ao trabalhador

É importante ressaltar que o desvio de função não se confunde com o acúmulo de funções. Enquanto o primeiro envolve a realização de atividades completamente distintas das contratadas, o segundo se caracteriza pela adição de tarefas dentro da mesma área de atuação.

A Questão da Insalubridade na Limpeza de Banheiros

A limpeza de banheiros é uma atividade que frequentemente gera discussões sobre o direito ao adicional de insalubridade. A Súmula 448 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) estabelece:

“A higienização de instalações sanitárias de uso público ou coletivo de grande circulação, e a respectiva coleta de lixo, por não se equiparar à limpeza em residências e escritórios, enseja o pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo, incidindo o disposto no Anexo 14 da NR-15 da Portaria do MTE nº 3.214/78 quanto à coleta e industrialização de lixo urbano.”

Critérios para Concessão do Adicional de Insalubridade

CritérioDescrição
Tipo de BanheiroUso público ou coletivo
CirculaçãoGrande fluxo de pessoas
AtividadeHigienização e coleta de lixo
GrauMáximo (40% do salário mínimo)

É fundamental observar que nem toda atividade de limpeza de banheiros gera direito ao adicional de insalubridade. A jurisprudência tem se consolidado no sentido de que banheiros de uso restrito, como os de escritórios com poucos funcionários, não se enquadram na hipótese prevista na Súmula 448 do TST.

O Papel da Legislação Trabalhista

A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não trata especificamente do desvio de função, mas oferece bases legais para a proteção do trabalhador em situações similares. O artigo 468 da CLT estabelece:

“Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.”

Este dispositivo legal protege o trabalhador contra alterações unilaterais em suas condições de trabalho que possam lhe causar prejuízos. No caso do desvio de função para atividades insalubres, como a limpeza de banheiros de grande circulação, o empregado tem o direito de receber o adicional correspondente ou, caso não concorde com a mudança, solicitar a rescisão indireta do contrato de trabalho, com base no artigo 483 da CLT.

Comprovação do Desvio de Função e da Insalubridade

Para garantir seus direitos, o trabalhador que se encontra em situação de desvio de função e/ou realizando atividades insalubres deve reunir provas que comprovem sua situação. Algumas formas de evidenciar o desvio de função e a exposição a condições insalubres incluem:

  • Registros de ponto que demonstrem a realização de atividades fora do horário ou local de trabalho habitual
  • E-mails, mensagens ou outros documentos que comprovem a atribuição de tarefas não previstas no contrato
  • Testemunhas que possam confirmar as atividades realizadas
  • Laudos técnicos que atestem as condições insalubres do ambiente de trabalho

É importante que o trabalhador mantenha um registro detalhado de suas atividades e, se possível, comunique formalmente à empresa sua situação, solicitando a regularização.

Consequências para o Empregador

O empregador que pratica o desvio de função ou não paga o adicional de insalubridade devido pode enfrentar diversas consequências legais, incluindo:

  1. Pagamento retroativo do adicional de insalubridade
  2. Multas administrativas aplicadas pelo Ministério do Trabalho
  3. Indenizações por danos morais e materiais
  4. Rescisão indireta do contrato de trabalho, com todas as verbas rescisórias devidas

Além disso, a empresa pode sofrer danos à sua reputação e enfrentar dificuldades na retenção de talentos, uma vez que práticas irregulares tendem a se tornar conhecidas no mercado de trabalho.

A Importância da Prevenção e da Adequação

Para evitar problemas relacionados ao desvio de função e à insalubridade, as empresas devem adotar medidas preventivas, tais como:

  • Realizar avaliações periódicas das condições de trabalho
  • Fornecer equipamentos de proteção individual (EPIs) adequados
  • Manter atualizados os laudos técnicos das condições ambientais de trabalho (LTCAT)
  • Promover treinamentos sobre segurança e saúde no trabalho
  • Revisar regularmente as descrições de cargos e funções

Essas medidas não apenas protegem os trabalhadores, mas também resguardam a empresa de possíveis ações trabalhistas e contribuem para um ambiente de trabalho mais saudável e produtivo.

Jurisprudência Recente

Os tribunais brasileiros têm se manifestado consistentemente sobre a questão do desvio de função e da insalubridade na limpeza de banheiros. Uma decisão recente da 3ª Turma do TST reafirmou o entendimento de que a limpeza de banheiros de uso coletivo em empresas justifica o pagamento do adicional de insalubridade.

O ministro Alberto Bastos Balazeiro, relator do caso, destacou a importância do meio ambiente de trabalho como um direito fundamental do trabalhador, consagrado pela Constituição Federal. Ele também ressaltou a recente inclusão da saúde e segurança no trabalho como um dos princípios e direitos fundamentais pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) em 2022.

Impacto das Decisões Judiciais

Essas decisões têm um impacto significativo na forma como as empresas devem tratar a questão da limpeza de banheiros e outras atividades potencialmente insalubres. Elas reforçam a necessidade de:

  1. Avaliar cuidadosamente as condições de trabalho
  2. Classificar corretamente as atividades quanto à insalubridade
  3. Pagar os adicionais devidos
  4. Implementar medidas de proteção à saúde dos trabalhadores

Orientações para Trabalhadores e Empregadores

Diante da complexidade do tema, é fundamental que tanto trabalhadores quanto empregadores busquem orientação jurídica especializada. Um advogado trabalhista experiente pode auxiliar na análise das situações específicas, na interpretação da legislação aplicável e na adoção das medidas mais adequadas para cada caso.

Para os trabalhadores, é importante:

  • Conhecer seus direitos e as atividades previstas em seu contrato de trabalho
  • Documentar situações de desvio de função ou exposição a condições insalubres
  • Comunicar formalmente à empresa qualquer irregularidade
  • Buscar orientação sindical ou jurídica em caso de dúvidas ou conflitos

Para os empregadores, recomenda-se:

  • Manter uma política clara de descrição de cargos e funções
  • Realizar avaliações periódicas das condições de trabalho
  • Implementar programas de saúde e segurança ocupacional
  • Buscar assessoria jurídica preventiva para evitar problemas trabalhistas

Conclusão

Sim, o funcionário que limpa banheiros, mesmo que em desvio de função, deve receber adicional de insalubridade – o não pagamento do adicional é ilícito trabalhista e gera o dever de indenizar pela verba não paga.

O desvio de função e o direito ao adicional de insalubridade na limpeza de banheiros são questões complexas que demandam atenção tanto de trabalhadores quanto de empregadores. A legislação trabalhista e a jurisprudência dos tribunais superiores têm evoluído no sentido de proteger a saúde e a dignidade dos trabalhadores, reconhecendo o direito ao adicional de insalubridade em situações de exposição a agentes nocivos, como na limpeza de banheiros de grande circulação.

É fundamental que as empresas adotem uma postura proativa, avaliando regularmente as condições de trabalho e adequando suas práticas às exigências legais. Por outro lado, os trabalhadores devem estar cientes de seus direitos e buscar orientação adequada quando se sentirem prejudicados. Somente com o esforço conjunto de empregados, empregadores e órgãos fiscalizadores será possível construir um ambiente de trabalho mais justo, seguro e saudável para todos.

Compartilhe:

Foto de Marcel Sanches
Marcel Sanches
Autor e Revisor
Advogado na Ls Advogados. Especialista em Direito Privado e Atuação nos Tribunais Superiores.
Últimos Posts
Direito Trabalhista e Previdenciário

NR 35: tudo sobre a norma que regulamenta o trabalho em altura!

A segurança no trabalho é uma preocupação constante em diversos setores, especialmente naqueles que envolvem atividades em altura. Nesse contexto, a Norma Regulamentadora 35 (NR 35) desempenha um papel crucial ao estabelecer os requisitos mínimos

Direito Trabalhista e Previdenciário

Diferença entre insalubridade e periculosidade: entenda detalhes!

No complexo universo do direito trabalhista, dois conceitos frequentemente se destacam e, por vezes, se confundem: insalubridade e periculosidade. Ambos estão intrinsecamente ligados às condições de trabalho e à segurança do trabalhador, mas possuem características

Direito Trabalhista e Previdenciário

Horista: conheça essa modalidade de trabalho e o que diz a CLT

O mercado de trabalho brasileiro é marcado por diversas modalidades de contratação, cada uma com suas particularidades e regras específicas. Entre essas modalidades, destaca-se o trabalho horista, uma forma de contratação que tem ganhado espaço

Direito Trabalhista e Previdenciário

Tire todas as dúvidas sobre a folga compensatória!

A folga compensatória é um tema de grande relevância no âmbito do direito trabalhista brasileiro, sendo um mecanismo que permite aos trabalhadores equilibrar sua jornada de trabalho e garantir períodos adequados de descanso. Neste artigo,

Direito Trabalhista e Previdenciário

NR 12: Como Adequar a Empresa e Principais Objetivos!

A Norma Regulamentadora 12 (NR 12) é um instrumento fundamental para garantir a segurança e a saúde dos trabalhadores que lidam com máquinas e equipamentos no ambiente de trabalho. Estabelecida pelo Ministério do Trabalho e

Direito Trabalhista e Previdenciário

Exame ASO: Obrigatoriedade e O Que Diz a NR-7

O Atestado de Saúde Ocupacional (ASO) é um documento fundamental no âmbito da saúde e segurança do trabalho, regulamentado pela Norma Regulamentadora nº 7 (NR-7) do Ministério do Trabalho e Emprego. Este artigo explora em

Direito Trabalhista e Previdenciário

Quais as Diferenças Entre Regime Celetista e Estatutário?

No cenário trabalhista brasileiro, dois regimes jurídicos se destacam: o celetista e o estatutário. Ambos regulamentam as relações de trabalho, mas apresentam características distintas que impactam diretamente na vida profissional dos trabalhadores. Este artigo se

Direito Trabalhista e Previdenciário

Vale alimentação: tudo sobre, o que diz a lei e obrigatoriedade!

O vale alimentação é um benefício muito valorizado pelos trabalhadores brasileiros, pois auxilia diretamente na qualidade de vida e no orçamento familiar. Entretanto, muitas dúvidas ainda pairam sobre esse tema, especialmente no que diz respeito

Direito Trabalhista e Previdenciário

Art. 62 da CLT e Horas Extras: Quais São As Regras?

O artigo 62 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) é um dispositivo legal que estabelece exceções à regra geral do pagamento de horas extras. Esse artigo tem gerado debates e controvérsias no âmbito trabalhista,

Direito Trabalhista e Previdenciário

Adicional de Categoria: Quem Tem Direito?

O adicional de categoria é um tema complexo e frequentemente mal compreendido no âmbito do direito trabalhista brasileiro. Este benefício, previsto em diversas legislações e convenções coletivas, visa compensar trabalhadores que exercem funções específicas ou

Direito Trabalhista e Previdenciário

Adicional de Periculosidade: Quais Profissões Têm Direito a Periculosidade?

O adicional de periculosidade é um direito trabalhista fundamental, concedido aos profissionais que exercem atividades consideradas perigosas, conforme estabelecido pela legislação brasileira. Este benefício visa compensar os trabalhadores expostos a riscos acentuados durante o desempenho

Áreas do Blog

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

whatsapp advogado online
Foto do Advogado
Leandro Lima - Ls Advogados
Online
Foto do Advogado
Olá! Tudo bem? Meu nome é Leandro Lima. Sou advogado aqui na Ls Advogados.

Mande pra gente uma mensagem explicando seu problema ou dúvida e vou analisar qual dos nossos advogados é o especialista na área.

Vamos te chamar no WhatsApp para conversarmos melhor!

Até lá! 👋👨‍⚖️🙏
0 caracteres
Enviando, aguarde!


Problemas com o preenchimento?! Revise suas respostas e fique atento:
01) Todos os campos devem estar preenchidos;
02) Digite seu telefone com o DDD sem o zero do começo e sem símbolos ou traços;
03) Emails válidos possuem "@" seguido de um domínio (ex: "fulano@gmail.com");
04) Alguns usuários relatam que o navegador Microsoft Edge não envia corretamente. Se estiver no PC, prefira Firefox ou Chrome.
Ls Advogados – CNPJ: 42.967.996/0001-59 – OAB/SP 39124 · Pioneiros no Atendimento 100% Digital em Todo o Território Nacional · Saiba Mais Sobre Nós