O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) recentemente decidiu um caso envolvendo a Amil Assistência Médica Internacional S/A e um usuário de seu plano de saúde. O consumidor, diagnosticado com Adenocarcinoma do Ducto Excretor com origem na Glândula Salivar Menor, enfrentou a negativa da operadora em fornecer o medicamento Enhertu (Trastuzumabe Deruxtecana), prescrito por seu médico.
Sumário
ToggleInicialmente, o paciente havia sido tratado com o medicamento Herceptin (Trastuzumabe), cuja cobertura também foi negada pela Amil sob alegação de uso off-label. O consumidor conseguiu acesso a esse primeiro medicamento através de uma ação judicial anterior.
Com o agravamento de seu quadro clínico, o médico assistente prescreveu o Enhertu como nova linha de tratamento. Novamente, a Amil negou a cobertura, utilizando o mesmo argumento de uso off-label do medicamento.
Decisão Judicial: Amil Deve Fornecer o Enhertu
Diante da negativa da Amil, o consumidor recorreu ao Judiciário. Em primeira instância, a juíza Heloisa Assunção Pereira Pandini, da 2ª Vara Cível do Foro Regional de Santo Amaro, concedeu a tutela de urgência, determinando que a Amil autorizasse, fornecesse ou custeasse o tratamento com o Enhertu no prazo de cinco dias.
A decisão baseou-se no relatório médico apresentado, que confirmava o diagnóstico e a necessidade do tratamento com o medicamento solicitado. Além disso, foram apresentados relatos de ensaios clínicos indicando a eficácia do Enhertu para o caso específico do paciente.
A juíza estabeleceu uma multa diária de R$ 5.000,00, limitada inicialmente a R$ 100.000,00, em caso de descumprimento da ordem judicial.
Recurso da Amil: Argumentos Contra o Fornecimento do Enhertu
Insatisfeita com a decisão, a Amil interpôs um Agravo de Instrumento, alegando que:
- O Enhertu seria um medicamento off-label, não indicado para a patologia específica do paciente.
- Não haveria cobertura contratual para o fornecimento do medicamento.
- Os critérios para concessão da tutela de urgência não teriam sido preenchidos.
- O prazo concedido para cumprimento da obrigação seria exíguo.
- O valor das astreintes (multa diária) seria excessivo.
A operadora solicitou a concessão de efeito suspensivo ao recurso e, ao final, seu provimento para revogar a decisão agravada.
TJSP Mantém Decisão: Amil Deve Fornecer o Enhertu
A 2ª Câmara de Direito Privado do TJSP, sob relatoria da Desembargadora Ana Paula Corrêa Patiño, analisou o recurso da Amil e decidiu por unanimidade negar provimento ao agravo de instrumento.
Os principais fundamentos da decisão foram:
- Autonomia médica: O tribunal reafirmou que cabe exclusivamente ao médico assistente indicar o tratamento adequado ao paciente. A operadora de saúde não pode estabelecer empecilhos indevidos com objetivos puramente financeiros.
- Cobertura de tratamento off-label: Mesmo que o Enhertu fosse utilizado de maneira off-label, isso não justificaria a negativa de cobertura. O tribunal entendeu que compete apenas ao médico que acompanha o paciente decidir se o uso de determinado medicamento é adequado, ainda que a bula não tenha indicação específica para a patologia.
- Rol da ANS não é taxativo: O tribunal ressaltou que a lista de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) não é taxativa, mas exemplificativa do mínimo obrigatório a ser assegurado aos beneficiários de planos de saúde.
- Súmulas do TJSP: A decisão citou as Súmulas 102 e 95 do TJSP, que estabelecem ser abusiva a negativa de cobertura de tratamento com expressa indicação médica, mesmo que não previsto no rol da ANS ou de natureza experimental.
- Princípio da boa-fé e função social do contrato: O tribunal considerou que a negativa da Amil afrontava os princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato, restringindo o próprio objeto do contrato de plano de saúde.
Enhertu: Eficácia no Tratamento de Adenocarcinoma
O Enhertu (Trastuzumabe Deruxtecana) é um medicamento inovador utilizado no tratamento de diversos tipos de câncer, incluindo o adenocarcinoma. Trata-se de um anticorpo conjugado direcionado ao HER2, que combina um anticorpo monoclonal com um agente quimioterápico.
Embora originalmente aprovado para o tratamento de câncer de mama metastático HER2-positivo, estudos recentes têm demonstrado sua eficácia em outros tipos de tumores que expressam HER2, como o adenocarcinoma do ducto salivar.
A utilização off-label do Enhertu, como no caso em questão, é respaldada por evidências científicas e pela prática médica, especialmente em casos de câncer avançado onde as opções de tratamento convencionais se esgotaram.
Impacto da Decisão: Amil e o Fornecimento do Enhertu
A decisão do TJSP reforça a obrigação das operadoras de planos de saúde em cobrir tratamentos prescritos pelos médicos assistentes, mesmo em casos de uso off-label ou não previstos no rol da ANS. Isso representa uma importante vitória para os consumidores e estabelece um precedente significativo para casos similares.
Para a Amil, a decisão implica não apenas no fornecimento imediato do Enhertu ao consumidor em questão, mas também na possibilidade de ter que rever suas políticas de cobertura para medicamentos off-label e tratamentos não listados no rol da ANS.
Argumentos da Amil Contra o Enhertu: Por Que Foram Rejeitados?
O tribunal rejeitou sistematicamente os argumentos apresentados pela Amil em seu recurso. Vejamos por que cada argumento não prosperou:
- Uso off-label do Enhertu: O TJSP entendeu que o uso off-label, quando prescrito pelo médico assistente, não é motivo para negativa de cobertura. A decisão médica prevalece sobre as limitações da bula.
- Falta de cobertura contratual: O tribunal considerou que a cobertura de tratamentos necessários à saúde do paciente é inerente ao próprio objeto do contrato de plano de saúde, não podendo ser limitada por cláusulas restritivas.
- Critérios da tutela de urgência: A corte entendeu que o relatório médico e os estudos apresentados eram suficientes para demonstrar a urgência e a necessidade do tratamento com Enhertu.
- Prazo exíguo para cumprimento: O tribunal considerou o prazo de cinco dias razoável, dado o caráter urgente da medida e a capacidade da Amil de cumprir rapidamente tais determinações.
- Valor das astreintes: A multa diária foi considerada proporcional e necessária para garantir o cumprimento da decisão, estando em linha com os valores usualmente aplicados em casos semelhantes.
Enhertu e o Tratamento de Adenocarcinoma: O Que Diz a Ciência?
O Enhertu tem se mostrado uma opção promissora no tratamento de diversos tipos de adenocarcinoma, especialmente aqueles que expressam a proteína HER2. Estudos clínicos recentes têm demonstrado resultados encorajadores:
- Eficácia em tumores sólidos: Um estudo de fase 2 publicado no New England Journal of Medicine mostrou que o Enhertu teve atividade antitumoral significativa em pacientes com vários tipos de tumores sólidos HER2-positivos, incluindo adenocarcinomas.
- Resposta durável: Pacientes tratados com Enhertu têm apresentado respostas duradouras, com alguns casos de remissão prolongada mesmo em estágios avançados da doença.
- Perfil de segurança: Embora o medicamento possa causar efeitos colaterais, seu perfil de segurança tem sido considerado gerenciável na maioria dos casos, especialmente quando comparado aos benefícios potenciais.
Amil e a Cobertura de Medicamentos Off-Label: Uma Questão Controversa
A negativa da Amil em cobrir o Enhertu por ser considerado de uso off-label levanta uma questão controversa no setor de saúde suplementar. Muitos medicamentos, especialmente em oncologia, são frequentemente utilizados fora das indicações específicas da bula, baseados em evidências científicas e na experiência clínica dos médicos.
A posição do TJSP neste caso alinha-se com uma tendência jurisprudencial que prioriza:
- A autonomia do médico na escolha do tratamento.
- O direito do paciente ao melhor tratamento disponível.
- A interpretação do contrato de plano de saúde em favor do consumidor.
Esta decisão pode servir como um importante precedente para outros casos envolvendo a Amil e outras operadoras de planos de saúde em situações similares.
O Que a Decisão Sobre o Enhertu Significa para os Consumidores da Amil?
Para os consumidores da Amil e de outros planos de saúde, esta decisão representa um fortalecimento de seus direitos. Alguns pontos importantes a serem considerados:
- Prescrição médica prevalece: A decisão reafirma que a indicação do médico assistente deve ser respeitada, mesmo em casos de uso off-label.
- Rol da ANS não é limitativo: O tribunal deixa claro que o rol de procedimentos da ANS é exemplificativo, não podendo ser usado para limitar tratamentos necessários.
- Possibilidade de recurso judicial: Em casos de negativa semelhante, os consumidores têm respaldo jurisprudencial para buscar seus direitos na Justiça.
- Importância da documentação médica: O caso ressalta a relevância de manter uma documentação médica detalhada, incluindo relatórios e estudos que embasem a necessidade do tratamento.
Amil e o Futuro da Cobertura de Tratamentos Inovadores Como o Enhertu
A decisão do TJSP no caso do Enhertu pode ter implicações significativas para a forma como a Amil e outras operadoras lidam com a cobertura de tratamentos inovadores e de uso off-label. Algumas possíveis consequências incluem:
- Revisão de políticas internas: A Amil pode ser levada a reavaliar seus critérios para aprovação de tratamentos, especialmente em casos oncológicos.
- Maior flexibilidade: Pode haver uma tendência à maior flexibilidade na aprovação de tratamentos prescritos por médicos, mesmo quando não estritamente alinhados com as indicações da bula.
- Aumento de custos: A cobertura mais ampla de tratamentos inovadores pode levar a um aumento nos custos operacionais, potencialmente refletindo nos preços dos planos.
- Investimento em análise técnica: As operadoras podem investir mais em equipes técnicas capazes de avaliar rapidamente a pertinência de tratamentos inovadores.
- Diálogo com a classe médica: Pode haver um esforço para estabelecer um diálogo mais próximo com a comunidade médica, buscando alinhar expectativas e critérios.
A decisão completa do TJSP no caso Amil vs. consumidor sobre o fornecimento do Enhertu pode ser acessada aqui. Este documento oferece uma visão detalhada dos argumentos apresentados e do raciocínio jurídico que levou à determinação de cobertura do medicamento.
Marcel Sanches, advogado especialista em Direito Privado e Atuação nos Tribunais Superiores, opina: “A decisão do TJSP no caso Amil vs. consumidor sobre o fornecimento do Enhertu é um marco importante na jurisprudência sobre planos de saúde. Ela reafirma o princípio da prevalência do interesse do paciente e da autonomia médica sobre considerações puramente econômicas das operadoras. Esta decisão deve servir como um alerta para que as empresas do setor revejam suas políticas de cobertura, especialmente em casos de tratamentos inovadores e uso off-label de medicamentos em oncologia.”
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