A profissão de caminhoneiro é fundamental para a economia brasileira, mas também envolve diversos riscos e desafios. Entre as questões trabalhistas que cercam essa atividade, o adicional de periculosidade é um tema que gera muitas dúvidas e debates. Neste artigo, vamos explorar em detalhes quando o caminhoneiro tem direito a esse adicional e quais são as situações que caracterizam a periculosidade nessa profissão.
Sumário
ToggleO que é o adicional de periculosidade?
O adicional de periculosidade é um direito trabalhista previsto na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para compensar trabalhadores que exercem atividades consideradas perigosas. Esse adicional visa remunerar o empregado pelo risco à sua integridade física decorrente da exposição a condições de trabalho que apresentam perigo acentuado.
De acordo com o artigo 193 da CLT, são consideradas atividades ou operações perigosas aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a:
- Inflamáveis, explosivos ou energia elétrica;
- Roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial;
- Atividades de segurança pessoal ou patrimonial com uso de motocicleta;
- Atividades com utilização de motocicleta no deslocamento de trabalhador em vias públicas.
Base legal do adicional de periculosidade para caminhoneiros
A regulamentação específica sobre o adicional de periculosidade para caminhoneiros está prevista na Norma Regulamentadora nº 16 (NR-16) do Ministério do Trabalho e Previdência. Esta norma estabelece os critérios técnicos para caracterização das atividades ou operações perigosas, incluindo aquelas relacionadas ao transporte de cargas.
É importante ressaltar que a legislação trabalhista está em constante evolução, e as interpretações sobre o direito ao adicional de periculosidade para caminhoneiros têm sofrido alterações ao longo do tempo. Por isso, é fundamental estar atento às atualizações normativas e jurisprudenciais sobre o tema.
Situações que caracterizam periculosidade para caminhoneiros
Transporte de cargas perigosas
Uma das principais situações que caracterizam a periculosidade para caminhoneiros é o transporte de cargas consideradas perigosas. De acordo com a NR-16, são considerados materiais perigosos:
- Explosivos
- Gases inflamáveis e não inflamáveis
- Líquidos inflamáveis
- Sólidos inflamáveis
- Substâncias oxidantes e peróxidos orgânicos
- Substâncias tóxicas e infectantes
- Materiais radioativos
- Substâncias corrosivas
Caminhoneiros que transportam regularmente esses tipos de materiais têm direito ao adicional de periculosidade, desde que a exposição seja permanente e em condições de risco acentuado.
Caminhões com tanque suplementar de combustível
Historicamente, os motoristas que conduziam veículos com tanque suplementar de combustível com capacidade superior a 200 litros tinham direito ao adicional de periculosidade. Essa interpretação baseava-se no entendimento de que o volume adicional de combustível representava um risco acentuado de incêndio ou explosão.
No entanto, é importante notar que houve mudanças recentes na legislação que afetam esse entendimento. A Lei 14.766/2023 alterou a CLT para excluir expressamente essa situação como caracterizadora de periculosidade. Abordaremos essas mudanças em detalhes mais adiante.
Exposição a roubos e violência
Embora não seja uma situação específica prevista na NR-16 para caminhoneiros, a exposição constante a riscos de roubos e violência durante o transporte de cargas valiosas pode, em alguns casos, ser considerada como condição de periculosidade. No entanto, essa caracterização depende de análise caso a caso e pode ser objeto de discussão judicial.
Valor do adicional de periculosidade
O adicional de periculosidade corresponde a 30% do salário base do empregado, conforme estabelecido no § 1º do artigo 193 da CLT. É importante ressaltar que esse percentual incide sobre o salário base, sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa.
Para ilustrar, vejamos um exemplo:
Salário Base | Adicional de Periculosidade (30%) | Remuneração Total |
---|---|---|
R$ 3.000,00 | R$ 900,00 | R$ 3.900,00 |
Neste exemplo, um caminhoneiro com salário base de R$ 3.000,00, ao receber o adicional de periculosidade, teria um acréscimo de R$ 900,00 em sua remuneração, totalizando R$ 3.900,00.
Controvérsias e mudanças recentes na legislação
Lei 14.766/2023 e suas implicações
Em dezembro de 2023, entrou em vigor a Lei 14.766/2023, que trouxe mudanças significativas na caracterização da periculosidade para caminhoneiros. A nova legislação alterou o artigo 193 da CLT, acrescentando o seguinte parágrafo:
“§ 5º Não é considerada perigosa, para os efeitos deste artigo, a exposição às quantidades de inflamáveis contidas nos tanques de combustíveis originais de fábrica e suplementares, certificados pelo órgão competente, para consumo próprio de veículos de carga e de transporte coletivo de passageiros, de máquinas e de equipamentos, e nos equipamentos de refrigeração de carga.”
Essa alteração legislativa impactou diretamente o entendimento anterior sobre o direito ao adicional de periculosidade para motoristas que conduziam veículos com tanques suplementares. A nova redação exclui expressamente essa situação como caracterizadora de periculosidade, desde que os tanques sejam certificados pelo órgão competente e destinados ao consumo próprio do veículo.
Decisões judiciais e jurisprudência
As mudanças na legislação têm gerado novas interpretações por parte dos tribunais. Recentemente, a 8ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) proferiu uma decisão considerando improcedente um pedido de adicional de periculosidade para um motorista que conduzia veículo com tanque suplementar.
O ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos, relator do caso, argumentou que a norma regulamentadora sempre estipulou uma exceção ao definir que a quantidade de inflamáveis contidas em tanques para consumo próprio do veículo não deve ser considerada para fins de periculosidade, independentemente da capacidade dos tanques.
Essa decisão representa uma mudança significativa na jurisprudência do TST, que anteriormente tendia a reconhecer o direito ao adicional nessas situações. É importante que os caminhoneiros e empregadores estejam atentos a essas mudanças e busquem orientação jurídica especializada para avaliar cada caso concreto.
Como solicitar o adicional de periculosidade
Para solicitar o adicional de periculosidade, o caminhoneiro deve seguir os seguintes passos:
- Verificar se a atividade se enquadra nas situações previstas na NR-16 e na legislação vigente.
- Solicitar ao empregador o pagamento do adicional, preferencialmente por escrito.
- Caso o empregador se recuse a pagar, buscar orientação junto ao sindicato da categoria ou a um advogado especializado em direito trabalhista.
- Se necessário, ingressar com uma reclamação trabalhista para pleitear o reconhecimento do direito ao adicional.
É fundamental que o trabalhador reúna provas que demonstrem a exposição aos riscos que caracterizam a periculosidade, como documentos que comprovem o transporte de cargas perigosas ou laudos técnicos que atestem as condições de trabalho.
Direitos e deveres do empregador
Os empregadores têm a obrigação de identificar as atividades perigosas em suas operações e pagar o adicional de periculosidade aos trabalhadores expostos a essas condições. Além disso, devem:
- Realizar avaliações periódicas dos riscos no ambiente de trabalho.
- Implementar medidas de segurança para minimizar os riscos.
- Fornecer equipamentos de proteção individual (EPIs) adequados.
- Manter a documentação atualizada sobre as condições de trabalho e os riscos associados.
O não cumprimento dessas obrigações pode resultar em multas e ações trabalhistas, além de colocar em risco a saúde e segurança dos trabalhadores.
Impacto do adicional na aposentadoria do caminhoneiro
O adicional de periculosidade tem impacto direto na aposentadoria do caminhoneiro, pois integra a base de cálculo das contribuições previdenciárias. Isso significa que o valor do adicional é considerado para fins de cálculo do benefício previdenciário futuro.
Além disso, o trabalho em condições perigosas pode dar direito à aposentadoria especial, que permite a redução do tempo de contribuição necessário para a aposentadoria. No entanto, é importante ressaltar que a concessão da aposentadoria especial depende de comprovação técnica da exposição aos agentes nocivos e do cumprimento dos requisitos legais específicos.
Periculosidade vs. Insalubridade: entenda as diferenças
É comum haver confusão entre os conceitos de periculosidade e insalubridade. Embora ambos sejam adicionais previstos na legislação trabalhista, eles se referem a situações distintas:
Periculosidade | Insalubridade |
---|---|
Relacionada a atividades que implicam risco acentuado | Relacionada a atividades que expõem o trabalhador a agentes nocivos à saúde |
Adicional de 30% sobre o salário base | Adicional de 10%, 20% ou 40% sobre o salário mínimo |
Risco de acidente imediato (ex: explosão, incêndio) | Risco à saúde a longo prazo (ex: exposição a ruídos, produtos químicos) |
Regulamentada pela NR-16 | Regulamentada pela NR-15 |
É importante notar que o empregado não pode acumular os adicionais de periculosidade e insalubridade. Em caso de exposição a ambas as condições, o trabalhador deve optar pelo adicional mais vantajoso.
Conclusão
O direito ao adicional de periculosidade para caminhoneiros é um tema complexo e em constante evolução. As recentes mudanças legislativas e jurisprudenciais têm alterado significativamente o entendimento sobre as situações que caracterizam a periculosidade nessa profissão, especialmente no que diz respeito aos tanques suplementares de combustível.
Diante desse cenário dinâmico, é fundamental que tanto caminhoneiros quanto empregadores estejam sempre atualizados sobre seus direitos e obrigações. Em caso de dúvidas ou para uma análise detalhada de sua situação específica, é recomendável buscar orientação jurídica especializada. Somente com informação e assessoria adequadas será possível garantir o cumprimento da legislação trabalhista e a proteção dos direitos dos trabalhadores do setor de transporte rodoviário.